Povos nativos

     Embora este seja um dos temas mais polêmicos da antropologia, a teoria mais aceita é que o ser humano chegou à América em duas correntes migratórias, uma ocorrida por volta de 28.000 - 23.000 anos atrás e outra há 14.000 - 10.000 anos. Esses períodos coincidem com processos de esfriamento do planeta Terra, chamados de glaciações. Pelo menos 10 ciclos como esse ocorreram no último milhão de anos. Durante as glaciações, acumulou-se grande quantidade de gelo, especialmente próximo às calotas polares, resultando em diminuição substancial do nível dos oceanos. O resultado disso foi a formação de uma passagem seca pelo estreito de Bering, situado entre a Sibéria, no nordeste da Rússia, e o Alasca, no território Norte Americano localizado ao noroeste do Canadá. Existem evidências que o grupo étnico que atravessou durante a segunda migração diferia do primeiro grupo. Também existem evidências que foram somente essas as entradas que ocorreram, ou que pelo menos lograram sucesso, antes do descobrimento da América, em 1492. Ressalta-se que os períodos interglaciários provocavam o derretimento do gelo, elevação dos oceanos e fechamento da passagem, impedindo novas migrações, tanto de pessoas como de novos conhecimentos tecnológicos. 

     Essas entradas tão precoces, mesmo a mais tardia, há 10.000 anos, ocorreram ainda em uma fase em que o ser humano desempenhava atividades nômades de caça e coleta de vegetais, ou seja, antes do desenvolvimento da agricultura, metalurgia e etc... Talvez isso explique o desenvolvimento mais atrasado dos povos americanos, uma vez que todos esses conhecimentos, que foram desenvolvidos no velho mundo, tiveram que ser reinventados no novo mundo. E muitos deles realmente os foram.

     Por isso, quando a América foi descoberta, foi possível encontrar aqui povos em diferentes estágios de desenvolvimento cultural. Os povos em estágio menos desenvolvido eram nômades caçadores e coletores, que não conheciam a agricultura. Pode-se citar como exemplo os índios patagões, também chamados de “fueguinos”, que habitavam o sul da Argentina e Chile. Os povos em estágio intermediário de desenvolvimento eram seminômades, que possuíam uma agricultura incipiente e dependiam da caça para complementar a alimentação, como o fazem os índios da floresta tropical amazônica ainda hoje. Já os mais desenvolvidos dominavam bem a agricultura e possuíam animais domesticados de pastoreio, tais como os diversos povos que habitaram os altiplanos, especialmente do Peru, Bolívia e Equador.

     Os povos que habitavam o sul da Argentina e Chile eram nômades caçadores e coletores que se alimentavam de moluscos, caças, frutos e raízes. Usavam lanças com pontas de pedra lascada para abater os animais. Também faziam uso de bolhadeiras, que são pedras ligadas a tiras que são giradas com os braços e arremessadas sobre as presas. Vestiam-se em peles de animais caçados e utilizavam principalmente o fogo para se protegerem do rígido inverno patagônico. Ao descobrir o estreito que recebeu seu nome em 1520, Fernando de Magalhães denominou este lugar de Tierra Del Fuego e aos povos que ali habitavam de Fueguinos, dada a enorme quantidade de fogueiras acesas durante a noite.

     Os povos que habitavam a floresta tropical conheciam por volta de 30 diferentes tipos de plantas cultivadas, entre elas a mandioca, milho, bata-doce, abóbora, cana-de-açúcar, banana, abacaxi, entre outras. Praticavam a agricultura de “coivara”, mudando de área de cultivo freqüentemente. Neste sistema, derrubam as árvores e colocam fogo na mata. Plantam por dois, três ou no máximo quatro anos, uma vez que o solo pouco fértil ou a grande lixiviação dos nutrientes causada pelas chuvas os obriga a mudar de lugar. Da mesma forma, o faz a diminuição da disponibilidade de caça com o passar dos anos. O nomadismo ou o semi-nomadismo impede que o homem finque raízes, que produza ferramentas, que construa cidades, pois tudo que é criado não pode ser transportado.

     Já os povos que habitavam os altiplanos andinos tinham disponibilidade de solos muito mais férteis e menos vulneráveis à lixiviação dos nutrientes pelas chuvas. A agricultura aí desenvolvida era exuberante. Somente de batata, conheciam mais de ??? variedades. De milho, conheciam ???. Assim, a agricultura permitiu o sedentarismo e este permitiu o desenvolvimento de núcleos urbanos cada vez maiores e mais complexos, com especialização da mão de obra, resultando em maior desenvolvimento tecnológico, social, político e religioso. Exemplos disso são as culturas precedentes e que culminaram na cultura Incaica, encontrada pelos espanhóis ao desembarcarem na costa do Peru, em 1532. Quando estes chegaram aqui, encontraram cidades com ??? habitantes, ou seja, muito maior que qualquer cidade européia do mesmo período. O povo Inca conhecia muito bem a cerâmica, a tecelagem, a metalurgia, a matemática, a astronomia e etc... É bem verdade que não conheciam a roda, mas de que serviria ela se não existiam animais de grande porte para puxá-las? Também o uso da roda em um terreno tão acidentado, como o dos Andes, não teria grande valor. Mesmo sem ela, construíram um reino gigantesco, com cidades de pedra, estradas interligando as várias partes, canais de irrigação, sistema tributário, classes sociais, leis e etc. Sua cultura era tão desenvolvida que alguém ousou a afirmar que se os europeus não descobrissem a América, os americanos descobririam a Europa dentro de alguns séculos mais.


Cuevas de las Manos, Bajo Caracoles, Patagônia Argentina (2008).

Esta região, formada por “canyons” e fontes de água, favorece a disponibilidade de caça. Os povos nativos que habitavam essa região se aproveitavam do terreno acidentado para encurralar os animais, especialmente o guanaco. Estes eram abatidos com armas feitas com esferas de pedra, amarradas a tiras de couro, que eram giradas com os braços e arremessadas sobre a caça. Por volta de 9.000 até 1.500 anos atrás, as pessoas que viveram neste lugar passaram a deixar suas marcas. Escolheram justamente as mãos, parte do corpo que diferencia o ser humano dos outros animais. Quem passa por aqui tem nítida a sensação de que queriam dizer: “Olá, eu sou o bicho homem; uso minhas mãos e com elas deixo minhas marcas”. O desenho em negativo da mão era produzido colocando-se geralmente a mão esquerda sobre a parede de pedra e, em seguida, borrifando-se pigmentos minerais com a boca, por meio de tubos (geralmente ossos ocos e hastes vegetais). Outros desenhos representando caçadas também são encontrados no local.


Aldeia Indígena Ekeruá, Avaí, Estado de São Paulo, Brasil (2008).

Indígena Terena. Vários membros da etnia Terena, originária do estado do Mato Grosso do Sul, deixaram sua terra natal e foram transferidos para São Paulo, o estado mais populoso e industrializado do Brasil, em virtude de problemas ocorridos no deserto demográfico do estado onde viviam. Com a transferência e o processo de inclusão na sociedade branca, eles quase perderam sua cultura, especialmente a língua-mãe. 











Festa folclórica, Cidade de São Paulo, Estado de São Paulo, Brasil (2008). 

Indígena Patoxó. A etnia Pataxó, distribuída pelo sul da Bahia (Região Nordeste do Brasil), ganhou destaque nos noticiários brasileiros depois que um de seus membros (o índio Galdino de Jesus) morreu de maneira bárbara e atroz na Capital Brasileira. Um grupo de jovens da classe média-alta da cidade de Brasília ateou fogo em seu corpo, com o uso de 2 litros de álcool. Os “meninos”, três com idade maior de 18 anos e um menor, alegaram que procuravam apenas se divertir, achando que se tratasse de um mendigo. No momento do ataque, o líder Galdino estava dormindo em um ponto de ônibus, depois de finalizar uma série de reuniões, com representantes do governo, onde defendia os interesses de seu povo.     





Festa folclórica, Cidade de São Paulo, Estado de São Paulo, Brasil (2008). 

Pele vermelha. Mulher indígena apresenta pintura em cores vivas, com desenhos característicos de sua comunidade. 








Conjunto Arqueológico Moray, Moray, Província de Cuzco, Peru (2007).

Estação experimental pré-colombiana. Acredita-se que essas ruínas foram, no passado, uma estação experimental agrícola. A arquitetura dessa estrutura permite que haja diferença de até 5ºC entre cada terraço, sendo mais quente, quanto mais profundo, mimetizando, dessa forma, diferentes condições climáticas. Nesses terraços eram plantadas as diversas variedades de batata que, uma vez selecionadas, seriam distribuídas para as diferentes regiões do império Inca, cada uma com características climáticas próprias. Nos altiplanos andinos, centro de origem da batata, existe mais de 200 (rever!) variedades deste tubérculo.


Caacupé, Paraguai (2009).

“Pet indígena”. Enquanto nas grandes cidades criamos cães, gatos e outros animais de estimação, os povos indígenas possuem os mais diversos tipos de animais nativos, inclusive alguns considerados selvagens por nós.














Sítio Arqueológico Tiahuanaco (ou Tiwanaku), Proximidades do Lago Titicaca, Bolívia (2009).

Monumento lítico. A civilização Tiwanaku é considerada a precursora de todas as culturas que construíram grandes monumentos de pedras pela América do Sul, como fez a civilização Incaica.












Sítio Arqueológico Tiahuanaco (ou Tiwanaku), Proximidades do Lago Titicaca, Bolívia (2009).

Templo semi-subterrâneo. A civilização Tiwanaku floresceu a partir de 1.500 antes de Cristo e iniciou seu declínio no ano 900 da presente era. Por volta do ano 1.200 D.C., os moradores abandonaram a cidade, provavelmente em função da fome desencadeada por secas que devastaram as plantações.





Sítio Arqueológico Tiahuanaco (ou Tiwanaku), Proximidades do Lago Titicaca, Bolívia (2009).

Crânio Tiwanaku. Os Tiwanakus selecionavam as crianças mais inteligentes do império para se tornarem sábios. Essas crianças recebiam fôrmas (molduras) na cabeça com o intuito de deformar o crânio, pois acreditavam que isso as tornariam mais inteligentes. 












Sítio Arqueológico de Sillustani, Margens do Lago Titicaca, Peru (2009).

Chullpas de Sillustani. A civilização, que construiu essas rígidas estruturas de pedra, floresceu após o declínio da civilização Tiwanaco, por volta 1.200 D.C., e foi dominada posteriormente pelos Incas. As chullpas são urnas funerárias que possuíam a função de proteger os restos mortais das famílias nobres. É possível que também tenham desempenhado a função de demarcar o território dessas ricas famílias ou, ainda, como local sagrado para oferendas.


Ccatcca, Província de Cuzco, Peru (2009).

Senhora em trajes típicos. No Peru, onde o turismo é muito importante como fonte de renda, é comum encontrar pessoas locais usando trajes típicos e se oferecendo para tirar fotos com os turistas. Ao primeiro julgamento, parece que somente vestem essas fantasias seculares com o propósito de ganharem alguns trocados. A opinião muda quando encontramos, em um pequeno vilarejo, isolado em meio às montanhas, todas as pessoas - cidadãos comuns - usando aqueles mesmos trajes típicos encontrados nos pontos turísticos.